02 ago. 20
A Fantástica Gautier Lee: A Nova Cara do Cinema Brasileiro
Gautier Lee é uma artista completa. É diretora, roteirista, assistente de arte... É uma das novas protagonistas do cinema brasileiro e desenvolve um trabalho muito diverso no Rio Grande do Sul. A cineasta desfila por vários gêneros e está finalizando o seu curta, chamado Um- Oito-Oito, que conta a história de Kenia (Évellyn Santos Hoffmann), uma jovem que, após ser vítima de injúria racial na universidade, precisa lidar com a repercussão do fato. O filme faz parte de quatro projetos curtos da diretora. Além disso, Gautier foi selecionada esse ano pelo Sundance Institute para fazer parte do projeto Crafting Your Short Film. A realizadora também é membro – fundadora do Coletivo Macumba, que reúne profissionais negros e negras do audiovisual do Rio Grande do Sul. É integrante do Black Femme Supremacy e da Organization of Black Screenwriters. É uma jovem profissional com um currículo impressionante! Em mais um capítulo do Projeto Final Chica, Gautier fala sobre seus projetos atuais e sobre Vinil (2017), curta que marcou sua estreia no cinema fantástico.
[FG] Gautier, quando você decidiu estudar cinema? Quais são as suas principais influências na área?
Em 2011, durante um curso de teatro, eu comecei a levar uma câmera para as aulas e percebi que eu gostava bastante de gravar e editar. Até cheguei a fazer um documentário sobre a minha turma do teatro, mas não sabia que isso era cinema. Em 2014, depois de me mudar para Porto Alegre (eu sou de Angra dos Reis - RJ), eu descobri que poderia estudar audiovisual de forma acadêmica e então me joguei nisso.
[FG] Você é uma das roteiristas de Vinil (2017), um curta de terror que foi o seu trabalho de conclusão na faculdade. Eu fiquei muito impressionada com o trabalho de vocês. Você poderia falar um pouco sobre o curta? Como foi o processo de escrita do roteiro?
Eu escrevi o roteiro do Vinil junto a minha colega Sophia Lautert (ela também fez a direção de fotografia do curta). O processo foi bem simples. No começo eu escrevia as cenas de tortura e a Sophia escrevia as cenas familiares e a gente tentava juntar tudo. Depois de quase uns sete ou oito tratamentos, chegamos na versão final que foi filmada. Ao final, já não havia mais aquela divisão de "cenas de tortura para mim, cenas familiares para a Sophia". Nós duas tínhamos escrito bastante em todas as cenas.
[FG] Eu observei algumas coisas no curta. Que o roteiro é super visual, existem certas influências muito óbvias de alguns clássicos do horror, mas feitos de uma maneira muito criativa e original. Você poderia falar um pouco sobre isso? Quais foram as influências que vocês usaram? Como você também trabalhou na parte da fotografia do longa, você acha que ficou mais fácil o processo de construção do roteiro?
Uma das nossas referências mais óbvias foi o filme Psicose do Hitchcock. Mas também houveram referências super atuais. Por exemplo, a música final foi feita sob encomenda para o nosso filme, mas a referência que passamos para o músico foi Sign of The Times do Harry Styles. Também tínhamos uma pasta no Pinterest em que toda a equipe podia contribuir de forma colaborativa com imagens que estivessem de acordo com a estética que estávamos pensando para o filme. Sobre a fotografia, todos os méritos vão para a Sophia Lautert que é uma fotógrafa incrível e super talentosa. A construção do roteiro, para mim, ocorreu de forma independente da construção estética. Mas quando estávamos fazendo a decupagem e pensando em como íamos filmar, eu consegui trazer algumas das imagens mentais que haviam surgido durante a escrita para o processo de filmagem.
[FG] Eu queria conhecer um pouco mais de ti. O que você gosta do cinema de terror? Quais são seus diretores(as) favoritos(as)? Você tem algum projeto novo relacionado com o fantástico?
Eu sou o tipo de pessoa que morre de medo de filme de terror, quase não assisto na verdade. Mas tenho tido mais curiosidade sobre o gênero desde que o Jordan Peele lançou o longa "Get Out!". Eu achei incrível a forma como ele construiu a história e o tom do filme. Também estou bem curiosa sobre o remake de Candyman que ele está produzindo e que foi dirigido pela Nia DaCosta. Acho que talvez eu considere o Jordan Peele meu diretor favorito no gênero fantástico. Agora eu estou desenvolvendo um novo curta em um curso do Sundance Institute. Nesse novo trabalho eu quero trazer uma atmosfera mais assustadora, não sei se vai chegar a ser um filme de terror de fato, mas a ideia é tentar chegar o mais próximo possível do gênero.
[FG] Pensando um pouco no cinema feito no RS, por que você acha que os (as) cineastas gaúchos (as) abordam tão pouco temáticas fantásticas?
Acho que falta incentivo. Durante a faculdade alguns colegas meus queriam fazer um curta de terror e todos os professores foram contra o projeto. Mas eles (os alunos), foram teimosos e fizeram mesmo assim e ficou bem legal, e assustador. Também acho que a questão orçamentária pesa bastante. Por exemplo, nós tivemos que contratar um maquiador de efeitos especiais para o Vinil porque não tinha como fazer o filme sem ele. Mas acho que há uma nova leva de realizadores que estão fazendo curtas com temáticas fantásticas.
[FG] Gautier, você poderia falar um pouco sobre os seus próximos projetos? Você está produzindo quatro curtas, certo?
A ideia desse ano era gravar quatro curtas, sendo 3 de ficção e 1 documental. Com a quarentena só consegui gravar o primeiro de ficção, o Um-Oito-Oito, e agora estamos com uma campanha de financiamento coletivo para poder finalizá-lo. O próximo curta de ficção é o que eu mencionei que estou desenvolvendo no curso do Sundance Institute. Ele é um misto de romance com suspense. Minhas referências no momento são "Get Out!" do Jordan Peele e "Queen & Slim" da Melina Matsoukas. O terceiro curta de ficção ainda é só uma ideia que eu preciso amadurecer para poder escrever e filmar. E o curta documental também está em fase de desenvolvimento e pesquisa. Acho que esse vai ser o único feito em animação. Vai se tratar sobre a forma como corpos negros ocupam espaço.