Lúcifer de Terno: Conrad Veidt, um dos maiores atores do cinema de horror

O ator alemão Conrad Veidt deu vida para centenas de personagens. Foi um pianista com mãos amaldiçoadas. Vagou por becos geométricos escuros, vítima de um sonambulismo hipnótico macabro. Já foi até o próprio dono do inferno.
Um de seus grandes papéis foi o homem de olhos tristes que não conseguia parar de sorrir. Foi ilusionista, vilão nazista, árabe, príncipe, marquês, rei, estudante, dançarino, conde, marajá, lorde, e professor. É, sem dúvidas, um dos grandes nomes do Expressionismo Alemão. Connie era um ator completo. Além de ser extremamente talentoso, era muito engajado, e usava sua arte para defender as causas que acreditava. Tanto que protagonizou o primeiro longa-metragem de temática homossexual da história, a película Diferente dos Outros (1919).

     

Sendo um dos principais atores do Expressionismo Alemão, Veidt trabalhou com vários cineastas importantes do movimento, como F. W Murnau, Robert Wiene, e Richard Oswald. O seu papel mais famoso desse período é Cesare, o sonâmbulo do filme O Gabinete do Dr. Caligari (1920). No longa, algumas marcas de sua atuação já ficariam evidentes, como a profundidade do olhar e a sua expressividade corporal. Enquanto ainda trabalhava em solo germânico, Conrad fora contratado pelo diretor John Barrymore para protagonizar o longa-metragem Amor Boêmio (1927) e passou uma temporada em solo estadunidense. A película lhe rendeu um pequeno contrato com a Universal. Ele protagonizaria mais três películas nos EUA: O Passado de um Homem (1927), e os últimos filmes de terror mudos do estúdio, O Homem que Ri (1927) e Cena Final (1927).   

O Gabinete do Dr. Caligari (1920)
 
O Homem que Ri (1927)

Ao retornar para a Alemanha, o ator começava uma nova fase em sua carreira. Deixava para trás a fase silenciosa e embarcaria de vez no universo dos filmes falados. Veidt continuou trabalhando no país, mas o avanço do partido de Hitler em solo germânico fez que o ator tivesse que tomar uma atitude drástica. Por temer pela vida de sua esposa judia, Lily, Conrad fixou residência na Inglaterra. Em solo britânico,  interpretou personagens nazistas em filmes que faziam oposição ao regime de Hitler, algo que não era bem visto pelo Ministro da Propaganda do Terceiro Reich, Joseph Goebbels. Essa não tinha sido a única afronta de Veidt contra o regime. Todos os artistas que trabalhavam no cinema alemão precisavam preencher um questionário, explicitando sua raça e religião. O ator, que era protestante, escreveu no panfleto que era judeu. Goebbels ficou furioso. Esse atrito ganharia um contorno ainda mais obscuro. Conrad tinha aceitado viver o protagonista do filme O Judeu Suss (1934), dirigido pelo alemão Lothar Mendes, o qual estava sendo produzido na Inglaterra. Goebbels quis impedi-lo a todo custo. Quando Veidt foi para Berlim gravar o filme William Tell, militares nazistas o aprisionaram em um quarto de hotel, impedindo-o de retornar para a Inglaterra. Ele foi, inclusive, torturado por eles. O ator só foi solto depois de uma forte pressão do estúdio de filmagens. Quando conseguiu finalmente sair da Alemanha, Hitler baniu o ator de terras alemãs. Um dos atores mais famoso da história do teatro e do cinema alemão nunca mais voltaria para sua terra natal.




De volta para a Inglaterra, Veidt fez mais alguns filmes, como O Espião Submarino (1939), Nas Sombras da Noite (1940), e O Ladrão de Bagdá (1940). Terminou sua carreira em Hollywood, de forma prematura. Veidt faleceu aos 50 anos, vítima de um ataque cardíaco. Ironicamente, em seus últimos filmes, Conrad interpretou nas telas os vilões que mais abominava na vida real, os oficiais nazistas. Algo que foi realmente injusto. Sir Christopher Lee, um dos maiores fãs de Conrad Veidt, foi enfático sobre essa parte da trajetória do alemão em sua autobiografia, Lord of Misrule, lançada em 2003. Lee escreveu: “(...) então nós fomos por caminhos diferentes, ele para Hollywood e a sequência de papéis de oficiais nazistas em filmes que não o mereciam (...)”.

Não foi a única vez que o inglês demonstrou todo seu apreço pelo ator alemão. Certa vez ele disse:



Ele era meu ídolo. Ainda é. Ele tinha mais charme e mais presença, e mais poder do que qualquer ator que já vi. Era a combinação da voz e de seu rosto. Era hipnotizante para mim. Até hoje, minha esposa me dirá: 'Connie Veidt está metido em alguma coisa' e imediatamente gravarei às duas ou três da manhã. Eu sei que talvez não seja um filme bom, mas ele será. Eu não conseguia tirar meus olhos dele — seu poder, sua presença, as duas qualidades mais importantes de um ator. Você deve nascer com elas.


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